Postagens populares

quarta-feira, 24 de março de 2010

ARTIGO PUBLICADO EM ZERO HORA

Artigos
Sobre a Senectude , por José Carlos Teixeira Giorgis*

O turista ocasional não se admira mais da quantidade de idosos que encontra em viagem de turismo, pode-se arriscar que predominam: senhoras e senhores grisalhos com suas câmeras fotográficas; damas de cabelos brancos, porque as europeias não adotam tinturas; pessoas com passos trôpegos subindo degraus de museus e castelos; paraplégicos que enfrentam lombadas com destemor; cadeirantes e familiares usufruindo das paisagens a que se chega por caminhos íngremes; casais acumpliciados na visão do desconhecido: é admirável!Em alguns países, a população provecta quase encosta na mocidade; são tempos de políticas sanitárias que prolongam a existência e de pesquisas médicas que curam moléstias devastadoras; as descobertas estendem o fluxo vital, as técnicas modernas enfrentam as vicissitudes; encarquilhados viram atletas e ressequidos adquirem viço; os enrugados enfrentam os ferros da academia, comungando suores e olhares cúpidos; até os casmurros sorriem.O escriba foi ufano e eufórico até aqui, mas vamos combinar: que coisa mais cabotina essa tal de “melhor idade”!É a grande falácia da atualidade, é afirmação retórica digna dos sofistas gregos: como pode ser “melhor” quando se claudica, esbarra-se nas cadeiras, tem-se embaraço com os papéis que caem ao chão, acelera-se a chegada em casa para não molhar as calças, dói a cervical; o dentista nega o implante, o médico proíbe a cerveja, ovo nem pensar, expurgar a graxinha da costela, apenas frango insosso e peixe, léguas de verduras, manteiga só o rótulo; os olhos se repuxam para enxergar o lance televisivo, convenhamos: é a “melhor”?Isso sem abordar questões íntimas e viris, pela seriedade da página.Há coisa mais constrangedora que chegar ao laboratório com um balde cheio de água amarelada? Ou um pote escondendo os restos (indignos) da digestão?Atravessar uma rua com os enormes envelopes de radiografias, os passantes penalizados com o destino; aqueles olhares nas salas de espera, um exercício de adivinhação, estará pior que o vizinho; doutor, como está a próstata, volumosa? Subiu o colesterol mau, a glicose dispara; a maratona de níveis, até se aprendem limites.Em dia cinzento, imaginou-se uma nova maneira de contar a idade: pelas caixinhas dos remédios, tantas cápsulas, tantos anos, não é mais fácil?De manhã, uma para a pressão, outra para dilatar os vasos, ou problema gástrico; antes do almoço estamina e antiácido; no meio da tarde, e aí vai; além dos tratamentos alternativos e o remédio que curou o amigo, acupuntura, passe magnético, chá de losna ou pitangueira, xarope de guaco, água de melissa.Como diria Saint-Beuve, envelhecer é aborrecido, mas é a única forma de se viver muito tempo; ou como gritava aquele conterrâneo: é bom estar vivo!Mesmo para escrever lamúrias.
*desembargador aposentado



http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default2.jsp?uf=1&local=1&source=a2846464.xml&template=3898.dwt&edition=14338&section=1012
Powered By Blogger